Acreditam que o avanço tecnológico possa colocar em xeque a carreira da praticagem? Se sim, a médio ou longo prazo?
Boa tarde. Sou médico anestesiologista, não sou do meio naval, mas te mostrarei algumas semelhanças.
Se quiser um TL;DR do que vou escrever abaixo, este é o resumo:
No momento em a Marinha homologar a substituição de rebocadores por embarcações nao-tripuladas, acho que você pode começar a se preocupar.
Explico:
Hospitais, da mesma forma que Armadores, buscam o tempo todo soluções para dispensar anestesistas e substituir por robôs, por enfermeiros, por IA, por qualquer coisa. Acreditam que o anestesista é “um custo” quando na verdade adicionamos segurança na operação, nossos honorários são bem discretos em comparação ao ticket de uma cirurgia, e fazemos muito mais do que anestesiar. Criamos protocolos de segurança, ajudamos a dimensionar centros cirúrgicos, e quando ocorre uma situação de crise em outro setor, anestesistas sao os primeiros a serem chamados (mesmo não possuindo atribuição ou escala nesse setor).
CENÁRIO: Atualmente existem dispositivos capazes de controlar dois ou três aspectos de uma anestesia em sistema de alça fechada (imput => análise de contexto => decisão => validação => output/ação efetiva).
Cada um desses dispositivos (que são caros!) é capaz de monitorar e controlar UM aspecto da anestesia (OU consciência, OU dor, OU hemodinâmica, OU paralisia) e nenhum desses sistemas ainda é capaz de dialogar com os demais, ou seja, sistemas incapazes de interação.
Nenhum deles está nem próximo de ser validado para emprego sem supervisão humana (que é o sonho do fabricante), apenas auxiliam a desafogar o trabalho médico com tarefas delegáveis. Justamente porque esses aspectos interagem entre si, precisa de um cérebro atento e treinado pra pensar fora da caixa.
Uma IA que levasse em consideração batimetria, maré, vento e informações do(s) navios, isoladamente pode até contribuir, longe do mar, a propor soluções de manobra, enriquecer simuladores. Cenário diverso é pegar uma caixinha de silício, colocar nela um algoritmo abastecido com 5000 manobras que ele analisou e estudou, fazê-la receber variáveis tão diversas e dinâmicas pra tomar decisões críticas entre soltar ferro, trabalhar com leme, empregar thrusters, solicitar rebocadores, fazer tudo isso (dosando o que cada elemento desses contribui ou atrapalha na manobra)… ou não fazer nenhum deles (julgar riscos x benefícios) é situação que não imagino nenhum comandante de embarcação aceitando de bom grado nos próximos 10 anos.
Principalmente pela questão da imputabilidade: em caso de falha, quem responde ao inquérito? Quem terá a procuração para defender o algoritmo? O fabricante comparece ao tribunal junto com o Comandante?
E enquanto isso, afastam-se todos modelos desse fabricante da operação?